quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Entrevista Educação de Jovens e Adultos.

UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS
Curso de Pedagogia

Nome: Íris Letícia Sturmer dos Reis e Janaína Lucas da Rosa
Disciplina: Pedagogia: Cenários de Carreira e Focos de Atuação Profissional
Professora: Elí T. Henn Fabris
Semestre: 2011- 2
Horário: 51

Perguntas feitas na entrevista com a pedagoga professora da EJA.
1 .Dados de identificação da pedagoga
2. Há quanto tempo trabalha com a EJA?
3. E antes da EJA, trabalhava com quais séries?
4. Sendo professora da EJA, em mais alguma outra turma em outro horário?
5. Por que escolheste a EJA?
6. Quais são as maiores dificuldades dos alunos da EJA?
7. Quais são as maiores facilidades dos alunos da EJA?
8. Quais são os maiores desafios de ser uma professora da turma de EJA?
9. O que lhe traz mais satisfação em relação ao ensino-aprendizagem dos alunos?
10. Qual a melhor maneira de motivar os alunos a não desistirem do curso?
11. Há muita evasão? Quais são os motivos apontados pelos alunos desistentes?
12. O que é feito para que os alunos sejam e se mantenham motivados durante o ano?
13. Existe uma socialização de planejamentos entre as professoras de EJA da sua escola?
14. De que maneira o Curso de Pedagogia ajudou na escolha e atuação de ser professora na EJA?
15. A escola proporciona palestras, cursos, seminários sobre a Educação do Trabalhador?
16. Quais foram suas descobertas ao longo do processo de ensino- aprendizagem com os alunos da EJA?
17. As professoras de turmas da EJA, são ou estão sendo valorizadas na sua opinião? O que está faltando?
Transcrição da entrevista feita coma pedagoga Ana Lúcia, 41 anos, professora de EJA Alfabetização Etapa I da Escola Dante Bertolluci em Canela.
A entrevista durou cerca de 40 minutos.
Qual é sua formação?
Formação inicial em Magistério, Bacharelado em Turismo no ano de 2000, Pedagogia em 2006 e Pós Graduação em Supervisão Escolar em 2008.
Há quanto tempo trabalha com a EJA?
Em torno de 11 anos.
E antes da EJA, trabalhava com quais séries?
Fui muitos anos diretora de escola, também trabalhei quatro anos na Secretária de Educação de Canela, e fui professora de séries iniciais durante muito tempo até trabalhar com a EJA.
Sendo professora da EJA, tem mais alguma outra turma em outro horário?
Sim. Sou professora de uma turma de Pré em uma Escola na cidade de Gramado durante o período da tarde.
Por que escolheste a EJA?
Eu escolhi a Educação de Jovens e Adultos quando eu ainda estava trabalhando na Secretária de Educação, porque precisava trabalhar a noite. Eu sempre quis trabalhar com adultos e quando eu comecei, me apaixonei e não quis mais largar. É uma questão de “gostar mesmo” daquilo que faz, de conhecer as histórias de vida dos alunos, de ouvir a parte cultural que eles trazem, é bem apaixonante.
Teve algum contato com adultos que te deu essa vontade de trabalhar com a EJA?
Eu trabalhava com a coordenadora de Jovens e Adultos na Secretária de Educação, então eu já estava um pouco envolvida com essa realidade. Ela sempre contava como eram os adultos e eu sempre tive curiosidade de conhecer um pouco mais.
Quais são as maiores dificuldades dos alunos da EJA?
A dificuldade na verdade é auto-estima dos alunos, de eles acreditarem neles, que eles podem aprender. Na verdade essa é uma construção, um processo transformativo para os alunos, para alguns simplesmente cai o chão, muitos passaram a vida inteira sem saber ler e daí quando eles começam despertar para a leitura alguns se desesperam e tentam desistir e outros simplesmente se desestabilizam, eles estão lendo e não acreditam que estão lendo. Mas todo esse processo é uma questão cultural da Eja, não só aqui, mas no Brasil todo. Os alunos ficam muito tempo sem saber ler e escrever e quando finalmente estão tendo a oportunidade, muitas vezes não acreditam que são capazes. Eu tenho uma aluna, a Dona Júlia de 72 anos que está lendo e ela mesma se impressiona com a leitura que faz. É uma mudança cultural lenta, e ás vezes a escola só tem um ano para conseguir alfabetizar o aluno. E muitos deles têm uma relação com essa coisa do tempo de escola, de quantos anos eles precisam para saírem da escola lendo e escrevendo, muitos comentem que estão há 8 anos, 10 anos e que ainda não conseguem ler, mas cada um é diferente, tem um ritmo diferente, eles precisam esquecer esse tempo, esse prazo e pensarem que eles podem, que do jeito deles eles irão conseguir se alfabetizar.
Quais são as maiores facilidades dos alunos da EJA?
Acredito que seja a integração. Eles se apegam muito um no outro. Eles formam grupos, grupos de amigos que se apoiam. Muitas vezes eu preciso parar a aula para ouvir uma história de um dos alunos, em cima do que eles trazem, é possível fazer um planejamento depois. A maioria das histórias são bem parecidas, algumas histórias são de alunos que na infância não puderam estudar porque a escola era longe, ou porque os pais não queriam, queriam que os filhos ajudassem em casa, na lavoura, nas tarefas domésticas, e tinha toda a questão do trabalho infantil naquela época. Os alunos se encontram na educação de jovens e adultos, a socialização é bem importante dentro da Eja, seria um ponto forte que os alunos têm. E é importante que o professor veja e saiba disso para fortificar o grupo e que eles se mantenham até o final do ano, que eles permaneçam unidos e contem com o apoio um do outro.
Quais são os maiores desafios de ser uma professora da turma de EJA?
O maior desafio é tentar conhecer os alunos, cada um deles, conhecer a sua história, sua cultura e planejar em cima daquilo que eles trazem. Não trazer só coisas que a gente acha que eles precisam, mas tentar ouvir eles, descobrir do que eles gostam e o que eles buscam. Outro desafio também é tentar trocar figurinhas com outros professores da EJA, trabalhar dentro da sala de aula, cada professor tem um jeito, tentar avançar, conversar com os colegas para descobrir quais são os métodos que os professores usam e como os alunos aprendem. Eu acho que o professor da EJA precisa ser muito humilde, porque precisa ouvir muito os seus alunos e também fazer várias adaptações, não podemos trazer muitas coisas prontas, precisamos fazer com eles.
O que lhe traz mais satisfação em relação ao ensino-aprendizagem dos alunos?
Me traz muita satisfação quando os alunos estão contentes. Quando eles relatam as aprendizagens, que para eles é tão pouco, mas para nós professores, já é um grande avanço. Eu tenho uma aluna alfabética, que mês passado, muito contente se deu conta de que já estava lendo e que estava lendo sozinha e muito bem, sendo que até algum tempo atrás ele negava que sabia ler, dizia “Professora, eu não consigo ler!”. É importante quando eles mesmos percebem que estão conseguindo ler e é uma grande satisfação quando eles se dão conta disso e ficam felizes e satisfeitos pelo que conseguiram. Seja na leitura, na escrita ou até mesmo nos relacionamentos com os colegas, muitos deles passaram por muitas dificuldades quando eram crianças, um dos alunos o Seu Lindomar apanhava muito quando era menino, o pai o chamava de burro e dizia que ele nunca conseguiria aprender. O erro para esse senhor é a pior coisa, pois o pai não permitia que ele errasse, hoje ele tem grandes dificuldades de aprendizagem justamente por causa de tantos maus tratos sofridos na infância. Nós só aprendemos através do erro, e a insegurança faz parte da vida de qualquer adulto, principalmente de adultos que querem aprender a ler e a escrever e acham que não conseguiram por que já fazem muitos anos que pararam de estudar. É preciso que o professor entenda esse processo e saiba quais foram as situações que os seus alunos já passaram na vida.
Qual a melhor maneira de motivar os alunos a não desistirem do curso?
Eu penso que é formar um grupo aconchegante e acolhedor em sala de aula. Um grupo bem forte, bem unido, o grupo acaba sendo bem mais que a professora, porque a professora é a professora, está cobrando, está em cima dos alunos. Mas quando o grupo dá forças para os alunos, as coisas acabam sendo diferentes, eles se sentem motivados e acolhidos pelo grupo de amigos que formaram dentro da sala de aula. Alguns alunos que tiveram problemas familiares que queriam desistir, eu mesma liguei, fui atrás desses alunos e os próprios colegas também fizeram o mesmo. É importante se aproximar dos alunos, eles ficam impressionados de receberem uma visita da professora em suas casas, para o aluno da EJA é o máximo toda essa atenção e carinho que eles recebem da escola, da professora e dos colegas. Porque na EJA são vários os fatores que fazem com que muitos alunos não concluam o curso, questões de baixa estima, questões financeiras, familiares, profissionais e também alguns conteúdos que não chamam atenção dos alunos. Por isso é importante que o professor nunca pare de estudar, dessa maneira sempre terá atividades e propostas diferentes e inovadoras para os alunos, e trabalhar com conteúdos que sejam relevantes para os alunos, pois algumas vezes os alunos param de vir para a aula porque não estão gostando dela. Eu tive um aluno o Seu José que esse ano, ficou algumas semanas sem vir para a escola, sentiu muita falta dos estudos e do contato com a professora e com os alunos, acabou voltando e retornando com a corda toda, muito disposto e animado, prometeu continuar assim até o final do ano. É importante ressaltar a relação que os alunos mantem uns com os outros, eles se preocupam e gostam muito dos colegas, se alguém falta eles vão logo ligando e quem já sabe até manda mensagem para saber porque o colega não veio na aula.
Há muita evasão? Quais são os motivos apontados pelos alunos desistentes?
Sim, sempre há. Como eu já disse, muitas vezes é a família, o trabalho, questões financeiras, de saúde e também de falta de interesse pelo assunto que está sendo trabalhado em aula, o aluno espera e quer conteúdos relevantes, caso contrário, não se sente motivado e acaba desistindo.
O que é feito para que os alunos sejam e se mantenham motivados durante o ano?
Acredito que seja trabalhar assuntos relevantes e com significado para os alunos. Tem muitos alunos que querem tirar a carteira de motorista, outros querem saber mexer no caixa eletrônico do banco, outros querem ler o cartão de entrada do trabalho e outros querem simplesmente ler, para ajudar os filhos em casa com as tarefas. Proporcionar para os alunos atividades interessantes e que eles possam aprender alguma coisa útil com isso. Eu costumo trabalhar com a palavra toda, e da palavra eu vou pulando para as partes, para as sílabas, as letras, as vogais, as consoantes, alguns textos relacionados com a prática deles, das vivencia, de passeios feitos pela escola, tentar adequar o planejamento com a realidade da turma. Eu acho que desse modo, é uma grande motivação a vontade de aprender. É impressionante como eles compartilham isso uns com os outros, o que estão gostando, o que estão aprendendo, quais estão sendo as dificuldades e de como são sinceros em até mesmo comentar com os colegas os problemas e as situações que estão vivendo em casa, eles choram, eles riem, ironizam, debocham, a sala de aula acaba se tornando um confessionário, um fala, um dá uma sugestão, o outro conta a sua experiência, dá conselho, faz uma piada, um grupo formado desse modo, é um grupo unido e fortemente qualificado para aprender. Mesmo quando os alunos param por um tempo de estudar ou até mesmo desistem, a EJA está sempre de braços abertos esperando esses alunos retornarem.
Existe uma socialização de planejamentos entre as professoras de EJA da sua escola?
Na verdade aqui na escola, a gente até tenta, toda sexta feira nós temos as reuniões pedagógicas, onde construímos muitos projetos e idéias para por em prática durante o ano, integrando todas as áreas e todos os professores. Foi uma longa caminhada até conseguirmos chegar até aqui, porque na verdade é muito difícil trabalhar com tantos professores de tantas áreas de conhecimento e com turmas de diferentes etapas, cada professor tem um jeito de trabalhar. É preciso estarmos abertos para o novo, para trilhar novos caminhos sempre tentando melhorar a nossa prática.
De que maneira o Curso de Pedagogia ajudou na escolha e atuação de ser professora na EJA?
Acho que durante o curso de Pedagogia, todas as disciplinas que eu fiz me ajudaram muito, principalmente na questão de ser mais critica com tudo, antes eu simplesmente aceita as coisas e ponto final, hoje eu sou mais critica e procuro encontrar outras maneiras melhores de trabalhar, sou até mais critica na questão das políticas públicas, não de politicagem, mas de saber entender o que é bom para os alunos e o que vale a pena lutar, dos seus direitos, dos seus deveres, e de pensar que algumas coisas cabem mesmo apenas a nós, e que outras coisas cabem a nós, a escola e aos alunos, poder aceitar a opinião dos outros e pensar a respeito dela, acredito que o curso me auxiliou nisso.
A escola proporciona palestras, cursos, seminários sobre a Educação do Trabalhador?
Falando de um modo geral, infelizmente o nosso município não oferece cursos, palestras ou seminários. Eu fiz um curso de 180 horas a distância sobre a EJA, fui eu quem buscou essa capacitação. Eu penso que o município deveria proporcionar um diferencial para professores de EJA. Esse curso que eu fiz foi totalmente gratuito e o município não precisou pagar nada, foi bom para o município, mas nós professores também gostaríamos de capacitação em serviço, porque isso é formação, e nos ajuda no nosso trabalho.
Quais foram suas descobertas ao longo do processo de ensino-aprendizagem com os alunos da EJA?
Ah foram muitas! O aluno tem uma forma de aprender, precisamos ouvi-lo pra que a gente saiba a melhor maneira de trabalhar com ele e de perceber como ele vê e se relaciona com o mundo. Ás vezes a gente pensa que ele percebe de qualquer forma, e daí a gente chega com um determinado planejamento que nem sempre dá certo. As maiores descobertas seriam na questão de ouvir, ouvir o que o aluno traz e a partir disso construir a aula, que na verdade não é fácil, pois o planejamento precisa ser diário e de coisas novas. Eu estou sempre pesquisando em livros, na internet, com outros professores matérias interessantes para trazer para a aula. Esses dias trabalhamos em cima de uma fábula, e falava sobre a importância de se trabalhar em grupo, eu trouxe justamente esse texto porque percebi que os alunos precisam dele.
Com a sua turma de EJA e na escola onde está inserida, o que está faltando para os alunos?
Como eu tenho alunos de inclusão, faltam profissionais para me ajudar e ajudar também esses alunos, eu sendo professora de alfabetização não me sinto completamente segura para trabalhar com alunos de inclusão, e também na EJA aparecem muitos alunos de 15 e 16 anos que foram expulsos de suas escolas e acabam vindo parar aqui, a escola não oferece uma psicopedagoga para auxiliar esses alunos, nós até temos uma supervisora no período da noite, mas ela está sempre envolvida com a parte burocrática e acaba passando muito pouco tempo com os alunos, nós precisaríamos de mais professores para fazerem oficinas, falta uma estrutura melhor pela demanda que nós temos, assim como as escolas do dia, reforço escolar e outras coisas. Um grande avanço que a escola deu esse ano, na metade do ano pra cá, foi a sala de AEE, uma sala multifuncional especifica para uma professora trabalhar com aqueles alunos de inclusão que realmente precisam de apoio. Durante esses 11 anos que eu estou na Eja, é a primeira vez que eu vejo isso realmente sair do papel e virar concreto.
As professoras de turmas da EJA, são ou estão sendo valorizadas na sua opinião? O que está faltando?
Acredito que na medida do possível estão. Aqui na escola estamos sempre fazendo um montão de coisas legais, mas dificilmente a comunidade fica sabendo, mas um pouco é relaxamento nosso, pois nós não divulgamos muito, por isso não aparece muita coisa no jornal sobre as turmas da EJA sobre os passeios, as palestras e outras atividades. A capacitação em serviço é um tipo de valorização, se tu têm capacitação em serviço, tu está acreditando naquele profissional, isso faz com que o professor se sinta sendo valorizado e que estão acreditando nele, acho que é isso uma das coisas que estão faltando.

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